quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Amargura no Pingo Doce

Tudo se passa com a normalidade de uma tragédia há muito anunciada. A situação de crise que vivemos faz com que, paradoxo dos paradoxos, os empregados do Pingo Doce tenham de recorrer a ajuda alimentar. Independentemente dos devaneios consumistas que alguns destes possam ter tido, ressaltam desta notícia dois factos preocupantes:
- A continuação da doutrina da competitividade baseada em baixos salários.
- Uma classe dirigente que continua a enriquecer enquanto os pobres ficam cada vez mais pobres.

Existe também uma componente paternalista que me choca. ["...o grupo decidiu que uma das áreas fundamentais de apoio será a formação em gestão do orçamento familiar, para garantir que os funcionários aprendem a gerir os seus rendimentos, evitando assim situações de sobreendividamento."]

Como é que se aprende a gerir ordenados de 500 ou 600 euros? Gere-se a sobrevivência e pouco mais. Este endividamento tem essencialmente duas causas. O desemprego de um dos cônjuges e a aquisição de casa própria. Todos (e digo todos) fomos convidados pelo nosso amigo o Banco, à aquisição de casa própria. Até há dois ou três anos o mercado de arrendamento era inexistente. As rendas eram superiores às prestações que se pagavam ao banco. Muitas vezes a compra não foi a opção mais desejada, mas, sobretudo, a mais económica. E quem negar este facto é mentiroso e demagogo.

9 comentários:

MManel disse...

Tristemente, deve ter começado a aparecer a ponta do iceberg.
Como já várias vezes referi a algumas pessoas que trabalham comigo - Abade de Neiva, concelho de Barcelos, zona têxtil e rural -
nas cidades não temos galinhas, nem couves ou batatas no quintal.
Assim ou temos euros na carteira ou não comemos e vivemos ao relento.
O que representa um salário de €500,00 numa zona como esta em nada se assemelha ao que vale no Porto ou em Lisboa, onde qualquer renda ultrapassa e bastante os €300,00.
Realmente, estamos todos hipotecados à banca.Mas estarão os bancos estão preparados para reduzir as próprias despesas? Cortar mordomias internas, acabar com luxos e diminuir a massa salarial?
Cá por enquanto tem andado o Zé Pagode direta e indiretamente a suportar esta treta, pois fomos nós que pagamos os salários do BPN, embora na generalidade ganhemos menos - todos sabemos que a banca tem os mais altos salários médios, ou seja, ninguém ganha mal

Na Suíça e em Inglaterra já foram despedidos milhares de trabalhadores.
Provavelmente é melhor começarem a mentalizar-se ...

Bisoux

Fernando Lopes disse...

Manel,

Os bancos não escaparão incólumes a esta crise. Têm uma carteira imensa de imóveis como colateral que está brutalmente desvalorizada.
Sem querer minimizar a culpa que os bancos têm no cartório, pelo outro lado sem o crédito barato e fácil muita gente nunca teria acedido a uma habitação condigna. Diabolizar uma das partes desta equação não me parece muito sensato.

Beijo,

Anónimo disse...

O diabo é bem maior para as empresas ...


Bjs

MManel disse...

MManel

Fernando Lopes disse...

Manel,

Não conheço a realidade das empresas.
Mas acredito que seja ainda mais difícil para as empresas, devido ao crédito "intensivo".


Beijo,

Fenix disse...

Fernando,

Este post fez-me lembrar um livro que li há muitos anos do Jorge Amado- "Terras do Sem Fim", em que o patrão vendia aos trabalhadores o alojamento, a comida, a roupa e até as ferramentas com que trabalhavam a desbravar a mata para a plantação do café. No final do mês quando iam receber o salário e fazer o acerto de contas, o débito era sempre superior ao crédito, e assim sucessivamente numa vida de escravatura até à morte...

Parece que são esses laços que os neoliberais querem resgatar para esta sociedade, não lhe parece?

Abraço
Ana

Fernando Lopes disse...

Ana,

Isso foi feito no Japão com a Mitsubishi, salvo erro. Uma cidade própria, com banco e construtora própria. O dinheiro nunca saía da empresa que pagava o salário, vendia a habitação e o automóvel and so on ..

O Soares dos Santos só está a aplicar conceitos conhecidos.

Abraço,
Fernando

O abominável careca disse...

Caro Zé,

Em face dos actuais vencimentos auferidos por uma larga franja da população, das duas uma, ou começámos a cultivar uns vegetais e a criar uns animais por conta própria ou então os "Pingos Doces" e "Continentes" tenderão a ser uma miragem nos hábitos de consumo do "falido" cliente citadino. Espero que isto seja uma profecia sem pés nem cabeça, para bem de todos nós...
Um abraço sem cartão nem promoção...:)

Fernando Lopes disse...

Abominável,

A terra a quem a trabalha!!!
Não à lei Barreto!

Muito bom o teu abraço sem cartão! :)

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