segunda-feira, 25 de julho de 2011

Fundamentalismos



O atentado ocorrido na Noruega tem-se prestado às mais diversas interpretações. O mainstream tende a separar o facto de o atentado ter sido concebido e perpetrado por um cristão da sua dimensão religiosa. Dois pesos e duas medidas que chocam quem, apesar de culturalmente integrado na matriz judaico-cristã europeia, se sente distante do divino e das perturbações a ele associadas.

No entanto, o fundamentalismo católico existe. O Papa Bento XVI já mostrou a sua permissividade para com as missas em latim e movimentos católicos radicais. A missa em latim passaria a ser um ritual medieval, incompreensível para a esmagadora maioria dos católicos. E isto é uma forma encapotada de submissão dos fiéis aos pastores e um rito que dista muito pouco das orações das madrassas repetidas ad infinitum até que sejam interiorizadas como a verdade única.

Existe fundamentalismo católico, ou cristão num sentido mais lato, na América de Sarah Palin e de Michele Bachmann, na Igreja católica de Bento XVI, na Opus Dei e em outros movimentos católicos de cariz conservador. Atirar pedras ao que nos é estranho, é sempre a atitude fácil. Compreender que o fundamentalismo é transversal e existe também no cristianismo é essencial sob pena de num mundo plural sermos tentados a ver e compreender uma verdade parcelar.

P.S. - Reflexões complementares no arrastão e no albergue.

8 comentários:

Anónimo disse...

As religiões no seu âmago, receitam aos seus seguidores e fiéis algo transversal: a busca da sabedoria, através da palavra, seja de Deus ou dos pensamentos dos seus profetas e fundadores e apóstolos.
Esta "receita" da sabedoria, que se propõe pela meditação e oração constante, não visa perceber a física quântica, a medicina nuclear, ou a astrofísica.
mas sim almeja o bom senso que nos faça reagir da maneira correta perante os desafios e armadilhas do dia a dia, e perante as decepções e alegrias da vida.
A auto crítica e o próprio conhecimento são uma das bases deste património, e das mais difíceis de alcançar, porque os outros surgem sempre com mais defeitos e suscetíveis de correção do que nós mesmos.
Parece-me por isso, que em muitos dos casos destes bombistas e/ou terroristas aparece um fator "corretivo" dos outros, baseados numa sobrevalorização pessoal.
Por razões comerciais, já visitei a Noruega - Trondheim, a terceira cidade, e conheço bastantes noruegueses. São simpáticos, bastante fechados enapreciam sobremaneira a capacidade de comunicação e a abertura nos contatos interpessoais dos portugueses (além do nosso clima...)
Vivem uma preocupação latente com o bem estar económico geral, procurando a justiça. São muitos honrados nos negócios, e detestam os chamados "macetes".
Mas são estranhos no comportamento social entre si, ignorando-se mutuamente, mas com uma confiança total uns nos outros (o que agora terá terminado)

Vi carrinhos de bebé (com os bebés lá dentro) à porta dos cafés onde estavam os pais (ou um deles) com os amigos, montes de mochilas e capacetes à porta dos centros comerciais (que não abrem ao domingo, e fecham no máximo às 20H), mas também vi alguém passar numa florista e sem querer atirar um vaso ao chão, mas não o apanhar, vi pessoas idosas a viver num hotel para quebrar a solidão, mas com os empregados a não lhe dirigirem uma palavra.
Na televisão, que não era muito difícil de seguir, (o norueguês tem muitas palavras inglesas e alemãs), passava um anúncio institucional por causa da violência doméstica - cerca de 60% das famílias em 2004, quando lá estive, tinham problemas de agressão entre os elementos do casal.
A pior doença é a que cresce no nosso âmago, sem sinais exteriores, porque finalmente quando se declara costuma ser mortal.
Foi o que sucedeu em Oslo.
Para mim é mesmo como uma cancro: a malignidade da questão desenvolve-se silenciosamente, auto nutrindo-se dos pensamentos errados, de origem múltipla e insaciável, que causa a fatalidade sem remédio.
Quanto ao perpetrador, a sua radicalidade é mias um julgamento demente dos outros, auto justificada por uma justiça sem sentido.

A natureza humana é um mistério sem limite.

Afinal conseguimos condenar e matar o próprio Jesus.


Bjs

M Manel disse...

M Manel não anónimo

Fernando Lopes disse...

Manel,

Na minha humilde opinião não te consegues separar da tua dimensão cristã. Se este atentado fosse executado por um muçulmano a perspectiva seria diferente.
Assim os católicos atribuem o atentado a tudo menos ao fanatismo religioso. Já ouvi explicações de todo o tipo desde a influência da literatura negra (saga Millennium p.ex.) até ao heavy-metal do Nuno Rogeiro. :)))
Não passam pelo facto de além de ser um tipo de direita e católico. O objectivo deste post é denunciar o preconceito cultural subjacente a todas as análises. A tua incluída porque continua a tentar "limpar" a opção religiosa que subjaz a este atentado. Mas isto é só o que eu penso, vale o que vale.

Beijo,

MManel disse...

Alô!

Não estás a perceber a ideia.
Aceito que seja fanatismo católico.
Nâo percebo é qual é a diferença que faz.
Para mim é tão condenável como o islâmico, skinhead, das FP 25 ou da ETA.

Cada um ouve o que interessa de cada uma das religiões ou das ideologias, porque raras são as pessoas que conseguem viver na essência.

Para mim o que vale são os atos.
As razões que levaram alguém a cometer este ou aquele crime não servem de justificação ou de desculpa, quer seja porque foi violado em criança ou porque é o Robin dos Bosques, ou o inquisidor justiceiro.


Mas isto penso eu.


Bj

Fernando Lopes disse...

Manel,

De acordo. Apenas linhas cruzadas que já descodifiquei. As explicações "antropológicas" e outras que ouvi, mataram-me aos bocadinhos. Para enriquecer o "debate" fica aqui um texto sobre fanatismo roubado ao Albergue Espanhol.

"A essência do fanatismo reside no desejo de obrigar os outros a mudar. Nessa tendência tão comum de melhorar o vizinho, de corrigir a esposa, de fazer o filho engenheiro ou de endireitar o irmão, em vez de deixá-los ser. O fanático é uma das mais generosas criaturas. O fanático é um grande altruísta. Está mais interessado nos outros do que em si próprio. Quer salvar a nossa alma, redimir-nos. Livrar-nos do pecado, do erro, do tabaco, da nossa fé ou da nossa carência de fé. Quer melhorar os nossos hábitos alimentares, ou curar-nos do alcoolismo e do hábito de votar. O fanático morre de amores pelo outro. Das duas uma: ou nos deita os braços ao pescoço porque nos ama de verdade ou se atira à nossa garganta em caso de sermos irrecuperáveis. Em qualquer caso, topograficamente falando, deitar os braços ao pescoço ou atirar-se à garganta é quase o mesmo gesto. De uma maneira ou de outra, o fanático está mais interessado no outro do que em si mesmo, pela simples razão de que tem um mesmo bastante exíguo ou mesmo nenhum mesmo"


Amos Oz - Contra o fanatismo


Kiss

MManel disse...

É isso.
No fundo, no fundo, o fanático acha que nos vai libertar de alguma coisa. Em último caso, ajuda-nos a libertar da nossa existência, um grande fardo para nós próprios(!)
Podia era optar por despachar-se a ele próprio, um ser tão visionário e superior...


Bj

Fenix disse...

Fernando,

Fanatismos à parte, o que mais me choca é que alguém, seja ele quem for e em nome do que quer que seja, se ache no direito de tirar a vida a outro. Ponto!

Abraço
Ana

Fernando Lopes disse...

Ana,

110% de acordo.

Abraço,

Fernando

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