sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

O divórcio de António


O divórcio foi para António, mais do que um renascer, uma libertação. A sua ex-mulher, com manias de intelectual e traços obsessivos, há muito que, como um buraco negro, lhe havia tragado a luz e o brilho.

E António era um profissional de sucesso, respeitado, um homem bem-parecido, que apesar dos seus 45 anos, corporizava os sonhos femininos. Alto, magro, tez morena e olhos claros, feições finas, um ar vagamente entre o artista e a estrela rock. Liberto das grilhetas das obrigações familiares e conjugais, António viveu durante anos uma vida dissoluta. Ninfetas pouco mais velhas que as suas filhas, modelos, jovens artistas fascinadas com a sua sensibilidade, todas passarem pelo seu leito.

Os amigos, com genuína admiração e alguma inveja, aconselhavam-no a procurar poiso certo. Preferia as ligações sem compromissos, jogos de sedução inconsequentes, avançou sempre enebriado para um vórtice de mulheres cada vez mais jovens, mais sedutoras.

O brilho esmoreceu, a idade avançou, o reconhecimento profissional foi decrescendo à medida que surgiam novos talentos. Vê-se agora António só, na sua enorme casa, entre livros raros e obras de arte criteriosamente seleccionadas. Enfadado, avança entre canais, relembrando com um sorriso ainda sedutor, o que lhe haviam dito amigos: "A idade torna-nos mais exigentes e menos desejáveis."

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