domingo, 13 de novembro de 2011

Varredores

Varredores de Rua, Carlos da Silva Prado, Museu de Arte de São Paulo

Caminham pela alameda, cada um no seu passeio. Como carris de comboio, paralelos sem nunca se encontrarem. Trazem uma vassoura rude mas resistente, e um carro cilíndrico. Num dos carros, um velho rádio pendurado, emite uma música fanhosa. Varrem com firmeza os milhares de folhas que as velhas árvores deixam tombar. Acumulam pequenos montes, posteriormente esmagados e compactados no carrinho. Sentam-se na beira do passeio para comer uma bucha. Passados minutos reiniciam o processo. Varrer, amontoar, compactar. Centenas, milhares de folhas, todas as noites. Nunca olham para trás, ignorando ostensivamente a natureza, que escarnece do seu trabalho e lentamente recomeça a cobrir com um novo manto, o chão à minutos imaculado.

2 comentários:

Fenix disse...

Fernando,

Gostei da descrição, apesar de nos transmitir uma certa melancolia, pelo trabalho monótono e quase sem sentido...e no entanto, quantos se sentiriam felizes se lhes dessem a oportunidade de o fazer!

Abraço
Ana

Fernando Lopes disse...

Ana,

Melancolia, de acordo, sem sentido, acho que não. A minha ideia foi, nos varredores, homenagear os trabalhos imperceptíveis e desvalorizados, sem os quais a nossa vida seria impossível. Este é um deles. Obscuro, feito durante a noite, mas fundamental para o nosso bem-estar. Estou certo que concordará comigo.

Abraço,
Fernando

Enviar um comentário

A minha alegria são os teus comentários. Simples ou elaborada a tua opinião conta. Faz-te ouvir! Comenta!